“Finanças Sem Stress” com… Pedro Andersson

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“Finanças Sem Stress” com... Pedro Andersson

O ComparaJá.pt lança hoje a rubrica “Finanças Sem Stress”, na qual os maiores “gurus” das finanças pessoais em Portugal descomplicam, numa entrevista descontraída, as melhores formas de gerir dinheiro e os segredos na hora de escolher produtos financeiros. O primeiro entrevistado é Pedro Andersson, jornalista coordenador da SIC e autor do programa “Contas-Poupança”.

Apaixonado pelo jornalismo desde que se conhece, Pedro Andersson começou aos 16 anos na rádio, curiosamente, tendo dado os primeiros passos no jornalismo na Rádio Clube da Covilhã. Seguiu-se, naturalmente, a ingressão na Universidade da Beira Interior, onde estudou Comunicação Social e, durante a licenciatura, estagiou na TSF, onde foi convidado para ficar como profissional ainda antes da conclusão do ensino superior.

O próximo desafio seria a fundação da SIC Notícias, casa onde se mantém até hoje, sendo responsável pela rubrica semanal Contas-Poupança, programa onde são abordados temas sobre finanças pessoais e produtos financeiros.

ComparaJá.pt – Pedro Andersson, o jornalismo económico foi, desde sempre, a sua área de eleição? Como é que surgiram as finanças pessoais enquanto principal foco do seu trabalho?

Pedro Andersson – Não. Nem por sombras. Sempre fui um jornalista polivalente, com funções de coordenação em largos períodos de tempo. Mas sempre gostei de tratar temas que tivessem uma ligação direta com os problemas “reais” das pessoas. Com a crise da troika, senti na pele as dificuldades financeiras de (quase) todos os portugueses e tive de, como muitos, pôr as minhas contas em ordem. Foi aí que percebi que os portugueses andaram distraídos durante todo o tempo das “vacas gordas”. Eu, Pedro Andersson, também. E comecei a renegociar TUDO. Luz, gás, seguros, o crédito à habitação, a tentar fazer compras inteligentes e perceber como é que as coisas funcionavam.

E descobri que andei durante anos a desperdiçar dinheiro. Era possível ter exatamente as mesmas coisas (ou melhor) por muito menos dinheiro. Sugeri à Direção de Informação da SIC em 2011 fazer uma rubrica semanal com as dicas de poupança que ia descobrindo por mim. A minha formação financeira é a formação financeira de um cidadão que parte em descoberta de uma vida financeira melhor e mais informada.

Acho que o sucesso do “Contas-poupança” na SIC vem daí. É feito por um consumidor “normal” que partilha o que descobre no dia-a-dia e que tenta explicar passo-a-passo como é que fiz para que outros possam repetir. O meu critério é: “Se resultou comigo, é porque pode resultar com todos”. Embora faça reportagens sobre finanças pessoais acho que é mais “cidadania” que “economia”.

CJ – Com base na sua experiência, quais considera ser as principais lacunas dos portugueses ao nível da literacia financeira? Que tipo de medidas/iniciativas deveriam ser implementadas para ajudar as famílias portuguesas a melhorar a sua gestão financeira?

PA – Para mim, a principal lacuna dos portugueses é não conseguirem interpretar os papéis que lhes põem à frente. E como não percebem o que está escrito (nos contratos, por exemplo) para não darem a entender que não percebem o que está ali, assinam de cruz. Obviamente, as empresas aproveitam para fazerem os contratos que querem. E depois o dinheiro sai e dizemos que não sabemos para onde ele foi.

A grande lição que aprendi durante estes últimos 5 anos é que o segredo é saber exatamente para onde é que o dinheiro vai (antes de ele sair). E só pago o que eu quiser ou for mesmo obrigado a pagar por não ter alternativas. É preciso saber dizer NÃO! O banco quer obrigá-lo a fazer um seguro – pode dizer não. Mas então não lhe dão o empréstimo… OK. Vai a outro lado. E corre todos até encontrar uma proposta que o satisfaça. Dá trabalho? Dá. Mas compensa. É dinheiro que fica no seu bolso para gastar no que realmente quer ou precisa.

O que as famílias precisam é de informação. Alguém que lhes abra os olhos. Gosto de pensar que na SIC estamos a fazer isso com essa rubrica e outras reportagens. Por sentir essa necessidade, é lançado em setembro um livro com as dicas mais relevantes do “Contas-poupança”. É uma espécie de manual prático SOS para quem não sabe por onde começar a pôr as contas em ordem.

Estes livros de finanças pessoais são pequenos contributos para mudar a mentalidade de muitos portugueses. Para além de vários autores, há também especialistas em finanças pessoais com rubricas regulares na SIC e em outros canais de informação que tentam ajudar os portugueses a melhorarem a sua literacia financeira. É um caminho que tem de se fazer.

E, obviamente, as escolas. Tem de ser a próxima geração a “ensinar” os atuais pais. Faltam disciplinas de educação financeira nas escolas desde cedo. Mas começam a surgir bons projetos.
O meu receio é que assim que a crise passe, volte tudo ao mesmo e sejam poucos os que realmente aprenderam algumas lições com o mau bocado que passámos.

CJ – Pedro Andersson, sente que os portugueses ajustaram comportamentos para fazer face à crise económica que se alastrou a vários países da União Europeia? Quais os principais aspetos de mudança?

PA – Sim. Muitos portugueses ajustaram os seus comportamentos. Fomos obrigados a isso. Passámos a fazer compras mais racionais. A gastar melhor o dinheiro. A renegociar os contratos e os seguros. A perceber como se fazem os créditos à habitação e quais são os produtos associados. A procurar as promoções e os descontos. A atrasar algumas compras. A criar um fundo de emergência, coisa que quase ninguém tinha. Aprendemos a viver com menos.

No meu caso aprendi que é possível, em alguns casos, manter o nível de vida com menos dinheiro. É sempre esse o objetivo das reportagens e na minha vida pessoal.

CJ – Pedro Andersson, havendo já alguns sinais de recuperação, e atendendo a que recentemente foi noticiado que a poupança das famílias estava a cair, pensa que os portugueses vão voltar a adotar os hábitos pré-crise?

PA – Sim. A grande maioria, assim que tiver a perceção de que a crise passou, vai voltar a trocar de carro com frequência (sem real necessidade), a fazer férias caras, a comprar uma casa melhor e a jantar fora mais vezes. Atenção, que nada disto tem alguma coisa de errado. Se tem dinheiro, gaste-o como entender. Não é um juízo de valor. Como tenho uma costela estrangeira (o meu pai era sueco) e uma costela portuguesa pelo lado da minha mãe, consigo ver as coisas de outro ângulo.

O meu lado português diz “Foi mau mas já passou, já podemos voltar à nossa vida normal. Se a crise voltar, logo se vê, como se fez agora. A malta desenrasca-se de alguma maneira”; o meu lado sueco diz “Devemos aprender lições do que aconteceu  para evitar que volte a acontecer…”. Mas esta última perspetiva não é nada romântica e exige sacrifícios. Precisamos do fado. Mas sinto as coisas a mudar lentamente. É positivo.

CJ – O “Contas-Poupança” é um programa de referência na área das Finanças Pessoais. Na sua opinião, quais foram os tópicos abordados que geraram mais impacto e que mais contribuíram para o aumento da transparência das instituições financeiras para com os consumidores nacionais?

PA – Os seguros de vida e os impostos, sem dúvida. Duas coisas que desde sempre consideramos que não há nada a fazer. É pagar e pronto. Descobri que não é assim. Pela primeira vez na minha vida fiz questão de entregar o IRS completamente sozinho sem ajuda de um contabilista para perceber as dificuldades que sente quem não tem formação de contabilista. Sinto-me agora quase doutorado em IRS. Aprendi coisas incríveis e identifiquei enormes injustiças e contradições na lei e na relação do Fisco com os contribuintes. E a importância de reclamar.

O mesmo em relação aos seguros. Descobri que os portugueses (salvo raras exceções) não fazem ideia do que contratam nos bancos e seguradoras. Só querem saber do que vão pagar hoje e não perguntam quanto é que aquele contrato vai custar daqui a 5 ou 10 anos e se o poderão pagar.

Os portugueses não leem as letras miudinhas. Têm de passar a ler mesmo que passem por “chatos e mesquinhos”. É o seu dinheiro que está em jogo. Um amigo meu na escritura da casa tinha 3 cópias em cima da mesa, em frente ao notário. Decidiu ler TODAS. Demorou cerca de meia hora. Só as rubricou e assinou depois de ter lido e confirmado que estavam exatamente iguais. Sabem que mais? Uma das cópias tinha valores errados. Pediram imensa desculpa e tiveram de ir à pressa corrigir a cópia.

Dava-se a esse trabalho? Duvido. Todos suspiravam e chamavam nomes ao meu amigo naquela sala. Mas é essa atitude que devemos ter. E riscar. E alterar. E dizer que não concorda. Eu sei, é uma luta de David contra Golias. Mas às vezes ganhamos.

CJ – Pedro Andersson, quais são as “regras de ouro” que aplica no dia-a-dia para garantir uma boa gestão do seu dinheiro?

PA – Saber exatamente quais são os meus rendimentos. Ao cêntimo. Anotar todas as despesas. Ao cêntimo. Decidir o que quero/preciso. Pedir orçamentos e pesquisar no mercado os preços. Escolher onde realizar a compra e negociar o preço. Pedir fatura. Ensinar aos meus filhos que o dinheiro é caro. Não dá para comprar… não se compra. Nunca me endividar.

Frederico Moura Martins

Sobre Frederico Moura Martins

Formado em Ciências da Comunicação e especializado em Ciência Política, o Frederico iniciou o seu percurso profissional em jornalismo e, posteriormente, em produção de conteúdos digitais. Procura aplicar a sua paixão por contar histórias na desmistificação da complexidade dos produtos e serviços financeiros para ajudar os portugueses a poupar e a tomar decisões informadas e conscientes nos diferentes âmbitos das suas Finanças Pessoais.

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