Todos os dias, tanto consumidores particulares como decisores empresariais – e até empresas públicas -, compram produtos financeiros que não percebem exatamente como funcionam. Os exemplos mais mediáticos são, provavelmente, os swaps adquiridos pelo Metropolitano de Lisboa, a Carris, o Metro do Porto e a STCP sem terem noção dos possíveis riscos e cenários de prejuízo. Mas, afinal, como se pode fazer face a esta realidade que, sobretudo quando se trata de empresas privadas, pode ter consequências nefastas?
O primeiro passo tem de ser, claro, tornar os produtos financeiros complexos mais fáceis de compreender.
Nesse mesmo sentido surge a vontade do Comité Conjunto das Autoridades Europeias e do Banco de Portugal (BdP) de reforçar a protecção dos consumidores através da criação regras mais apertadas na sua comunicação.
Este reforço vai requerer informação pré-contratual mais extensa, incluindo a variação do montante a receber pelo cliente que está sujeito a flutuações a indexantes ou valores de referência que impactam o desempenho do(s) activo(s) a serem adquiridos.
Os produtos financeiros complexos podem ser construídos de múltiplas formas e com prazos e taxas muito distintas – ou indexantes simples como a EURIBOR, ou mais complexos como um mercado ou fundo especifico. Na geralidade são depósitos, fundos, seguros ou obrigações que estão indexados a um outro ativo e que podem servir para proteger o investidor de um aumento no spread de um crédito.
Não percebeu a explicação? Então faz mesmo sentido que o Documento de Informação Fundamental que o BdP quer introduzir vá avante no sentido de melhorar a transparência deste mercado no seio da União Europeia.
A entrada em vigor do Regulamento (UE) n.o 1286/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho estava prevista para o início deste ano, mas, no sentido de garantir que as instituições financeiras têm tempo suficiente para se adaptarem às novas regras, só veremos a sua obrigatoriedade introduzida a partir de 1 de janeiro de 2018.
Este tipo de documento – que já existe para a generalidade dos produtos financeiros de retalho, como os depósitos simples, crédito automóvel, crédito pessoal ou crédito habitação – terá um formato pré-definido e permitirá a comparação de indicadores, sumários do risco e dos custos, mas também os cenários de possível rendimento comuns a todos os produtos – isto tudo para facilitar a comparação entre produtos.
E com esta ação teremos o “problema” resolvido? Não, não teremos. Até porque, tal como a sua denominação indica, se tratam de produtos financeiros complexos que requerem que os seus compradores tenham um bom nível literacia financeira de forma a perceberam as suas implicações. Visto Portugal surgir na 111ª posição no último estudo sobre literacia financeira da Standard & Poor’s, facilmente se percebe que esta exigência contrasta com o contexto nacional.
Já agora, considerando até que o consumidor tem conhecimentos suficientes para compreender as informações contidas no Documento de Informação Fundamental, uma vez que a sua análise cuidada levará algum tempo, atendendo a que estamos a falar de documentação relativamente extensa, não irão os consumidores prescindir da sua leitura dado existir uma espécie de “pressão” natural para não nos alongarmos demasiado – inclusivamente porque, regra geral, temos umas quantas pessoas a aguardar que nos despachemos – quando estamos a ser atendidos num balcão?
Os reguladores até podem introduzir leis e regulações positivas como estas, no entanto, é imprescindível que cada um de nós dedique o tempo suficiente para recolher a informação necessária para perceber os diferentes produtos e para comparar as ofertas existentes no mercado.
Já estamos tão habituados a fazê-lo para pacotes de telemóvel, preços de televisões, voos para as férias do verão, por que não também com os produtos financeiros, mesmo os mais complexos? E se individualmente não conseguirmos, então é recomendável procurar aconselhamento profissional.
É que para percebermos os resultados de uma escolha inconsciente neste campo basta pensar que, caso no exemplo retratado dos swaps estivéssemos a falar de uma empresa privada, muito provavelmente as consequências seriam a insolvência e o despedimento coletivo.
Dinheiro mal empregue, seja de origem privada ou pública, é sempre negativo para a economia, visto não cria o valor necessário para o seu desenvolvimento. As más decisões financeiras têm um impacto tremendo no futuro das pessoas e das empresas – e, em última instância, de um país.
O mote está, então, dado. Não importa se é um gestor empresarial, um decisor político ou apenas um investidor privado: antes de fazer o que quer que seja, pesquise, informe-se, compare, volte a informar-se e só depois dê o passo de adquirir a solução que considerar mais acertada.