O ComparaJá.pt sentou-se com Miguel Poisson, diretor-geral da ERA em Portugal, para, ao longo de hora e meia, discutir o passado, o presente e o futuro da área da mediação imobiliária em Portugal.
A ERA encontra-se em Portugal desde 1998 e conta com mais de duzentas agências em território nacional, sendo uma das líderes no setor da intermediação imobiliária.
Uma análise ao mercado da habitação em Portugal
A conversa começou por se focar no aumento de transações imobiliárias e da concessão de crédito à habitação que se tem registado nos últimos anos e Miguel Poisson, CEO da ERA, deu algumas explicações para este fenómeno:
“Uma parte do aumento do crédito vem da classe média portuguesa, que voltou a comprar. Outra vem dos investidores que precisam de rentabilidade para o seu capital, porque os tradicionais investimentos financeiros sem risco têm taxas muito baixas, chegando a ser inferiores a 1% nos depósitos a prazo”.
Relativamente a esta recuperação pujante do mercado português, pedimos a Miguel Poisson para partilhar com o ComparaJá.pt uma “previsão” para o curto-médio prazo:
“No mês de março foram feitos 720 milhões, depois equilibrou nos 500 milhões de euros … o crescimento vai-se fazendo assim, não é em linha reta. Recordamos que apesar do aumento significativo nos últimos anos, a concessão de crédito à habitação encontra-se ainda em níveis que representam um terço do que eram os valores em 2007”.
Da parte do diretor-geral da ERA, o prognóstico é positivo, afirmando que “estaremos na casa dos 600 milhões este ano e não me admirava que isto viesse para valores de 800 ou mil milhões, se não este ano, na primeira metade do próximo ano. Acho que tudo indica que as coisas evoluam nesse sentido.”
Parte deste investimento será, sem dúvida, relativo a investimento financeiro e não à compra para habitação própria e Miguel Poisson deixou-nos a sua opinião sobre esta nova vaga de inflows no mercado imobiliário português.
“O setor imobiliário tem sido o setor refúgio, por excelência, para os investidores, no qual conseguem muito facilmente rentabilidades de 4% a 6% se a propriedade for alocada a arrendamento e para quem entra no setor do alojamento local são possíveis, em alguns casos, rentabilidades de dois dígitos”.
Por outro lado, também a entrada de cidadãos estrangeiros no mercado nacional é dada como uma das razões para a recuperação do setor imobiliário português, referindo Miguel Poisson que “uma em cada cinco vendas” já são feitas para cidadãos não nacionais e que “muitos deles entram com capitais próprios.”
Como fator final tem-se o aumento da confiança que nos refere como causa, mencionando que “o nível de confiança dos portugueses é o mais alto dos últimos 16 anos” e apresentando a descida do desemprego, o crescimento do PIB “a níveis que começam a ser interessantes” e o melhoramento do outlook como algo que leva Portugal a “começar a evoluir de forma sustentada”.
Golden Visa: oportunidade desperdiçada no setor imobiliário?
Os Golden Visa também calharam em conversa e sobre estes Miguel Poisson afirma que “eram um produto muito interessante”, mas, no entanto, face às diversas controvérsias em que estiveram envolvidos, tais como “jogadas menos lícitas, favorecimentos” o resultado acabou por ser “destruir um produto que era ótimo para atrair investidores de fora da União Europeia”.
Como alternativa, a salvaguarda do investimento internacional tem sido o regime para residentes não-habituais.
Sobre os cidadãos da UE, face às poupanças que conseguem devido ao regime de residente não-habitual, “ao fim de 10 anos, a poupança fiscal através deste regime chega a ser suficiente para comprar um apartamento”. Miguel Poisson menciona ainda que, inicialmente, o que atraía pessoas para Portugal era o clima, a gastronomia e a hospitalidade, mas que estes fatores mudaram e hoje em dia “a segurança apresentada pelo nosso país, as boas infraestruturas, o bom acompanhamento médico e as boas universidades” são os fatores mais importantes.
Somando a estes temos ainda os benefícios fiscais para cidadãos estrangeiros que acabam por ser mais um fator de ponderação na vinda para Portugal.
Na área das tecnologias, também o setor imobiliário tem vindo a sentir alguma disrupção por força das grandes inovações, pelas mãos do Airbnb e da Uniplaces, por exemplo. Miguel Poisson refere ainda que “o Airbnb foi uma plataforma que ajudou, entre outras, a desenvolver e a dar visibilidade a Portugal, fez com que investidores tivessem comprado e remodelado imóveis degradados e hoje em dia quem passa em Alfama é uma diferença do dia para a noite.”
Para a ERA, estas mudanças são tidas globalmente como positivas para a economia portuguesa.
“Trouxe muitos estrangeiros a Portugal, esse fluxo de pessoas criou um défice na oferta de locais para as albergar e muitos investidores perceberam isso e compraram e remodelaram casas, tendo visto ideias de negócio que podiam ser desenvolvidas”.
Como tal, nas palavras de Miguel Poisson, os investidores devem estar atentos às possibilidades: “O que eu acredito é que zonas ‘prime’ muito dificilmente irão desvalorizar no futuro e, portanto, já não existe expetativa de poder vir a ter crescimentos de 10, 20, 30%, mas sim na perspetiva de virem a ter um investimento seguro – isso vale muito para um investidor particular poder comprar numa zona e ter ali uma garantia maior de não haver uma desvalorização do ativo”, aconselha. Portugal já não é só o “The great place in the sun” e oferece uma boa qualidade de vida (e não apenas um clima favorável) a quem quer fazer vida cá.
No entanto, existe a outra face da moeda: “É preciso também controlar esta reorganização urbana, pois muitas famílias portuguesas de classe média, e às vezes mesmo da média-alta, já não conseguem comprar casa nos bairros de Lisboa”, adverte o diretor-geral da ERA.
Para solidificar este novo paradigma “é preciso encontrar um novo equilíbrio em que se possa manter o lado típico das cidades para não o perder. São equilíbrios que vão ter que ser encontrados de forma a que possa haver uma coexistência entre famílias portuguesas a viverem nesses bairros e, ao mesmo tempo, atrair turistas e criar condições para os albergar.”
A bolha imobiliária é uma nuvem negra no horizonte?
O aumento significativo do montante de crédito à habitação concedido pelo sistema financeiro que tem sido registado desde 2015 (um crescimento de 163% até abril deste ano), já levou o Banco de Portugal a emitir algumas chamadas de atenção para que algumas das coisas que se revelaram problemáticas em 2011 não voltassem a acontecer.
Terá havido uma mudança no comportamento dos portugueses face há 10 anos atrás quando algumas pessoas recorriam a créditos sem a devida informação ou com montantes que estavam acima das suas capacidades?
“É uma boa pergunta e se calhar vou dar a resposta que eu menos gostaria de dar”, começa por afirmar Miguel Poisson. “Infelizmente a história, os ciclos económicos, desde a crise de 1929, e até podemos remontar a crises anteriores, têm-nos mostrado que, ao longo do tempo, os erros tendem a repetir-se”, relembra.
Uma das áreas que incita a considerar é a dos spreads. “Esta guerra de spreads está novamente a acontecer e aquilo que há uns anos se dizia ser impossível – o spread abaixo de 2% – hoje em dia já é possível obter 1,25% em alguns bancos.”
Mas os spreads mais reduzidos não são positivos? “Somos, à partida, levados a pensar que spreads mais baixos são muito bons para a mediação imobiliária porque há mais clientes a ter acesso a crédito com boas condições para comprar”. No entanto, deixa-nos um aviso “o que é bom a todos os níveis é que haja soluções equilibradas, porque aquilo que aconteceu em 2011 e 2012, e para quem viveu esta crise, é bom de vez em quando parar para pensar nos erros que foram cometidos para não voltar a cometê-los. Ninguém ganhou com o que aconteceu.”
Os Millennials estão a mudar o paradigma da habitação em Portugal?
Questionado sobre se a novas gerações têm hábitos de consumo diferentes relativamente à habitação, o diretor-geral da ERA responde: “Eu tenho ouvido muito falar desta nova geração, mas aquilo que depois vemos na realidade é uma coisa diferente.”
Descreve esta geração como tendo “mais mobilidade” e estando “à procura de novas experiências”, mas que, no entanto, tem mais dificuldade em ter uma situação laboral estável nos primeiros anos da vida profissional e que isto é acompanhado por “menos poder de compra e que seriam sempre pessoas que teriam de arrendar e não poderiam comprar”.
No que toca a números, a ERA informa que apenas 16% das suas transações são relativas a arrendamento e que em 2012 o arrendamento chegou a representar mais de 50% do total das operações em Portugal.
Ainda sobre o arrendamento, Miguel Poisson dá o exemplo de um apartamento T2 em Lisboa que normalmente seria arrendado por 800 euros e que poderá atualmente estar por 1.000 euros, ou mesmo 1.200 euros mensais, um aumento de quase 50% face ao valor que seria expetável.
“É um facto que é muito difícil, hoje em dia, para uma família – ou para um casal que acaba de se casar ou mesmo para uma pessoa que queira ir viver ou estudar – viver no centro de Lisboa, porque, de facto, as rendas estão muito inflacionadas e muito acima do valor que é razoável”, afirma Miguel Poisson.
E daqui em diante?
Fazendo uma previsão do futuro da intermediação imobiliária, a necessidade de evolução e de integração da tecnologia nos processos são um requisito obrigatório.
Miguel Poisson vê a agregação de serviços como o caminho do setor, especulando sobre um serviço em que “possam tratar da compra da casa, do financiamento, dos seguros, da mudança da casa, eventualmente uma remodelação, uma inspeção que seja necessária, etc. E as próprias plataformas tenderão a ter isso disponível”. O diretor-geral da ERA diz com convicção que esta integração da tecnologia é inevitável, mas que não acredita num negócio em “que há um comprador, um vendedor, uma plataforma e mais nada”.
Ficamos também a saber que o grande fator distintivo desta agência imobiliária será sempre “a especialização”, tendo capacidade para aconselhar desde “investidores a uma família portuguesa, seja de que classe for”, podendo oferecer aconselhamento no sentido de “tomarem a decisão certa e com a segurança necessária”.
Por último, a ERA mostrou-nos o seu papel como entidade formadora de empreendedores, tendo em conta a entrada, no mercado português, de novos franchisados estrangeiros. Estes novos empresários vêm de países como Venezuela, Brasil e França e têm aumentado o número de franquias da ERA atribuídas a cidadãos estrangeiros.
Com a instrução que lhes é proporcionada pela ERA, os novos associados passam a ser a ponte entre o mercado imobiliário português e os seus países de origem, potenciando ainda mais a entrada de investimento estrangeiro em Portugal e o desenvolvimento que este proporciona a longo prazo.